Esse ensaio foi publicado na Gazeta de Ribeirão, nº 36, do dia 20 de fevereiro de 2005. Diferentemente dos outros textos publicados nesse jornal, esse não trata especificamente de ciências mas traz um panorama geral sobre o ensino superior no Brasil. Obviamente, as opiniões expressas não esgotam o assunto.
Ensaio: No meio da tempestade
Charles Morphy D. Santos
A universidade brasileira vive em clima de permanente colapso. Parte dos problemas relaciona-se à sua origem elitista, criada como um bem cultural oferecido à minoria dominante, e também à crescente privatização do setor incentivada por políticas neoliberais dos governos federal e estaduais. Apesar da maioria esmagadora da pesquisa nacional se encontrar dentro das universidades públicas, elas têm seus orçamentos reduzidos a cada ano. A falta de estabilidade orçamentária aliada à pouca transparência sobre as verbas para o setor contribuem para lançar a academia no meio da tormenta.
Em geral, há um descompasso entre a pesquisa produzida nas universidades e as exigências tecnológicas do país. Não se defende aqui um modelo de ensino competitivo voltado diretamente para o mercado (como a universidade-empresa norte-americana), mas um modelo que se comprometa tanto com o desenvolvimento da pesquisa básica quanto com a produção de um saber que revele e transforme a realidade nacional. Hoje, a universidade encontra-se fortemente pressionada pelo mercado - na procura de pessoal qualificado para seu alto escalão - e pelas classes baixas - em busca de mobilidade social. Em todo o mundo, além da feroz competição mercantil, a academia envolve-se também nas lutas contra a discriminação, assumindo o papel pretensamente desempenhado pela Igreja há tempos: preservar tradições, produzir riqueza e conhecimento, e garantir o bem-estar. O choque entre a multiplicidade de funções a ele apregoadas e as suas concepções ideológicas originais está no cerne da crise atual do modelo de ensino superior.
Os currículos universitários encontram-se defasados, fragmentados e pouco maleáveis, o que dificulta o entrosamento interdisciplinar e a adequação dos programas aos interesses fundamentais da sociedade. Principalmente nas instituições públicas, os entraves às reformas curriculares impedem a modernização dos cursos. Assim, os gastos aumentam, o que não se reflete em aumento de qualidade. Com a carga horária inflacionada, o tempo para estudo e atualização reduz-se drasticamente, e a formação acadêmica distancia-se da amplitude e universalidade prometidas pelo ensino superior.
O quadro de crise é ainda pior se considerarmos a desvalorização da atividade docente (baixos salários nas instituições públicas e ausência de plano de carreira nas particulares) e a não participação da comunidade acadêmica nos processos de tomada de decisão. Também a estrutura de poder conservadora e centralizadora, fundida à incompetência de muitos dos responsáveis pelo seu funcionamento – envolvidos em projetos de forte apelo midiático como a abertura de novas unidades enquanto as existentes definham –, influenciam para o aumento do descrédito quanto ao presente e futuro da universidade brasileira.
Recobrar o status das instituições de ensino superior depende da recuperação da confiança nas instituições sociais e políticas do país, que não satisfazem os interesses emergentes. É imprescindível examinar de forma concreta a função da universidade na produção e disseminação de conhecimento e competência profissional, em vistas de se estabelecer políticas de ensino, pesquisa e extensão voltadas para a realidade regional e nacional. Cabe ao Estado assumir o seu papel na reformulação do projeto universitário, sem desconsiderar os interesses e as diferentes concepções presentes na própria academia.
Todos os segmentos da sociedade devem participar do soerguimento da universidade brasileira. Só a partir da mudança de identidade e conseqüente negação do seu caráter intrinsecamente elitista é que o ensino superior no Brasil poderá encontrar um modelo coerente e democrático de desenvolvimento.
Em geral, há um descompasso entre a pesquisa produzida nas universidades e as exigências tecnológicas do país. Não se defende aqui um modelo de ensino competitivo voltado diretamente para o mercado (como a universidade-empresa norte-americana), mas um modelo que se comprometa tanto com o desenvolvimento da pesquisa básica quanto com a produção de um saber que revele e transforme a realidade nacional. Hoje, a universidade encontra-se fortemente pressionada pelo mercado - na procura de pessoal qualificado para seu alto escalão - e pelas classes baixas - em busca de mobilidade social. Em todo o mundo, além da feroz competição mercantil, a academia envolve-se também nas lutas contra a discriminação, assumindo o papel pretensamente desempenhado pela Igreja há tempos: preservar tradições, produzir riqueza e conhecimento, e garantir o bem-estar. O choque entre a multiplicidade de funções a ele apregoadas e as suas concepções ideológicas originais está no cerne da crise atual do modelo de ensino superior.
Os currículos universitários encontram-se defasados, fragmentados e pouco maleáveis, o que dificulta o entrosamento interdisciplinar e a adequação dos programas aos interesses fundamentais da sociedade. Principalmente nas instituições públicas, os entraves às reformas curriculares impedem a modernização dos cursos. Assim, os gastos aumentam, o que não se reflete em aumento de qualidade. Com a carga horária inflacionada, o tempo para estudo e atualização reduz-se drasticamente, e a formação acadêmica distancia-se da amplitude e universalidade prometidas pelo ensino superior.
O quadro de crise é ainda pior se considerarmos a desvalorização da atividade docente (baixos salários nas instituições públicas e ausência de plano de carreira nas particulares) e a não participação da comunidade acadêmica nos processos de tomada de decisão. Também a estrutura de poder conservadora e centralizadora, fundida à incompetência de muitos dos responsáveis pelo seu funcionamento – envolvidos em projetos de forte apelo midiático como a abertura de novas unidades enquanto as existentes definham –, influenciam para o aumento do descrédito quanto ao presente e futuro da universidade brasileira.
Recobrar o status das instituições de ensino superior depende da recuperação da confiança nas instituições sociais e políticas do país, que não satisfazem os interesses emergentes. É imprescindível examinar de forma concreta a função da universidade na produção e disseminação de conhecimento e competência profissional, em vistas de se estabelecer políticas de ensino, pesquisa e extensão voltadas para a realidade regional e nacional. Cabe ao Estado assumir o seu papel na reformulação do projeto universitário, sem desconsiderar os interesses e as diferentes concepções presentes na própria academia.
Todos os segmentos da sociedade devem participar do soerguimento da universidade brasileira. Só a partir da mudança de identidade e conseqüente negação do seu caráter intrinsecamente elitista é que o ensino superior no Brasil poderá encontrar um modelo coerente e democrático de desenvolvimento.
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